Desde pelo menos o início de novembro de 2022, ainda antes da votação final global do Orçamento do Estado para 2023, multiplicaram-se as notícias dando conta do intuito do Ministro da Saúde, Dr. Manuel Pizarro, de criar uma "Urgência Metropolitana" na Grande Lisboa. Segundo as notícias, este passo permitiria vantagens como "qualidade", "segurança", "proximidade", "equidade" e "previsibilidade". Relativamente à previsibilidade, o senhor Ministro tinha razão: com o encerramento declarado e premeditado de Serviços de Urgência (SU), passou de facto a ser previsível a impossibilidade de grávidas, pais, doentes com patologia de vário tipo, acederem a estes SU nos hospitais da sua área, tendo de se deslocar para outros concelhos ou até distritos.
Logo em dezembro foi dada "previsibilidade" às Maternidades, com anúncio de encerramento de várias unidades no Natal, situação que se foi repetindo ao longo dos meses. A partir de fevereiro foi sendo dada a notícia da "previsibilidade" dos SU de Pediatria, com encerramento em alguns horários no Hospital Beatriz Ângelo (em Loures) e no Hospital de Nossa Senhora do Rosário (no Barreiro). Em março falou-se de Urologia e Gastroenterologia. Em junho o Hospital Distrital de Santarém dava notícia da desactivação do SU de Psiquiatria, passando os utentes a ser atendidos em Lisboa, também com o objectivo de assegurar a "previsibilidade" (difícil será perceber a "proximidade").
Já em março o Sindicato Independente dos Médicos - SIM tinha alertado para o facto de a reorganização não poder significar encerramento e diminuição de acessibilidade aos doentes.
Encontrando-nos a meio da última quinzena de setembro, continuam as já habituais (infelizmente) informações do CSREPC (Comando Sub-Regional de Emergência e Protecção Civil) da Grande Lisboa - CODU/INEM (Centro de Orientação de Doentes Urgentes/Instituto Nacional de Emergência Médica):
# Hospital de Vila Franca de Xira: com constrangimentos no Serviço de Urgência de Cirurgia Geral, não sendo possível receber doentes até às 20:30 do dia 21/09/2023.
# Hospital de Cascais - Dr. José de Almeida: com constrangimentos no SU Obstétrica - Bloco Partos, não sendo possível receber doentes a partir das 17:27 do dia 21/09/2023.
# Maternidade Dr. Alfredo da Costa: com constrangimentos no SU Obstétrica - Bloco Partos, não sendo possível receber utentes até às 00:00 do dia 22/09/2023.
# Hospital Prof. Doutor Fernando Fonseca (Amadora-Sintra): com constrangimentos no SU Obstétrica - Bloco Partos, não sendo possível receber doentes até às 09:00 do dia 23/09/2023.
Todas as informações acompanhadas pelo pedido: "Solicitamos que os CB [Corpos de Bombeiros] da área de influência passem dados clínicos para que o CODU os possa referenciar".
Ao longo deste mesmo período, o SIM manteve-se sério na discussão de medidas para a Carreira Médica que pudessem resolver o problema de fundo, que extravasa os SU e se estende a todo o SNS. Do lado do Governo, houve apenas uma decisão unilateral de avançar para medidas legislativas sem chegar a acordo com os sindicatos, cujo concreto conteúdo ainda se desconhece.
O SIM em nada se opõe à eficiência e à boa gestão dos recursos públicos, antes pelo contrário, mas as medidas tomadas visam apenas tentar disfarçar a trajectória descendente que o SNS segue.
O SIM opõe-se, sim, que ao mesmo tempo que se fecham Serviços, nada seja feito para impedir que mais e mais médicos saiam do SNS, sendo gastos mais e mais milhões de euros a pagar a prestadores de serviços e a pagar mais trabalho suplementar aos médicos do SNS que ainda o aceitam fazer (bem para além das 150 horas anuais exigíveis por lei), com prejuízo da segurança e qualidade do atendimento.
O SIM opõe-se, sim, ao racionamento cego, com prejuízo no acesso dos utentes e doentes, não só aos SU, mas a todas as valências do SNS, sem que sejam tomadas medidas sérias para reverter o êxodo de médicos.
Senhor Ministro, para quando uma postura séria para resolução de problemas e não apenas esta séria intervenção propagandística?