Carta Aberta à Excelentíssima Senhora Ministra da SaúdeExcelência,
Quando do início das altas funções de Ministra da Saúde, endereçámos a Vossa Excelência, a 19/11/2018, um ofício de saudações e votos de felicidades que incluía um caderno reivindicativo que considerávamos - e consideramos - essencial à dignificação da atividade médica de Saúde Pública. Dizemos "consideramos” porque, infelizmente, nada se passou entretanto, não obstante o alegado "virar da página” da austeridade e de mais de 1 ano de exercício ministerial.
Recordo que priorizámos, junto de Vossa Excelência, as seguintes reivindicações – por terem sido, muitas delas, reiteradamente apresentadas e sistematicamente ignoradas, decorridos mais de 10 anos da chamada "Reforma Correia de Campos” dos Cuidados de Saúde Primários:
- Compensação pelo trabalho extraordinário no decurso da disponibilidade permanente. Existe, por parte, dos organismos competentes do SNS a confusão entre "disponibilidade permanente” e "trabalho extraordinário”: a primeira obriga à apresentação ao serviço, sempre que necessário, mas carece do abono do correspondente trabalho extraordinário. Continuamos a reivindicar, como direito elementar, o pagamento do trabalho extraordinário realizado ao abrigo do regime de disponibilidade permanente e levamos ao conhecimento de Vossa Excelência que, mais uma vez, por ocasião do recente ato eleitoral, a 6 de outubro p.p., a quase totalidade das ARS (à exceção da ARS Centro) não abonou, em conformidade, as autoridades de saúde.
- Atribuição do regime de disponibilidade permanente a todos os médicos da área de exercício profissional médico de Saúde Pública, independentemente do local de exercício de funções. Os médicos de Saúde Pública que exercem em organismos como o Instituto Nacional de Saúde Dr Ricardo Jorge ou a Direção-geral da Saúde, serviço central de Saúde Pública, encontram-se bizarramente excluídos deste regime essencial a uma resposta apropriada às novas ameaças à saúde das populações;
- Atribuição do suplemento remuneratório aos médicos que exercem o
poder de Autoridade de Saúde. Este suplemento encontra-se legalmente
previsto desde 2009, não obstante nunca ter sido atribuído, por ausência de regulamentação em sede de portaria conjunta. O SIM considera
irrevogável, porque da mais elementar justiça democrática, a atribuição
deste suplemento; acresce que dignificar o exercício do poder de
autoridade de saúde é dignificar, por consequência, o Estado e os
interesses da população.
- Abertura de vagas para especialistas em Saúde Pública em hospitais, em conformidade com uma nova Saúde Pública, equidistante dos diversos níveis de cuidados de saúde do SNS e com o constante do despacho nº 7216/2015, de 24 de junho, publicado em Diário da República n.º 126/2015, Série II de 2015/07/01. O exercício profissional dos médicos de Saúde Pública em contexto hospitalar afigura-se da maior pertinência epidemiológica e sistémica.
- Criação de centros de avaliação médica para benefícios fiscais e sociais. Trata-se de uma proposta originalmente apresentada pela CNSP a 19 de maio de 2018, por ocasião da sua primeira reunião, conforme publicado em Comunicado da Comissão Nacional de Saúde Pública. O SIM preconiza a criação de centros de avaliação médica para benefícios fiscais e sociais, de âmbito interministerial, integrando as diversas "juntas" existentes na dependência do Estado, para o qual podem vir a contribuir, pela sua valiosa experiência, ainda que a título supletivo e voluntário, os médicos de Saúde Pública. Esta proposta transcende a área de exercício profissional médico de Saúde Pública, além de resultar em inequívocos benefícios para os utentes.
40 anos decorridos da criação do Serviço Nacional de Saúde, continuamos a aguardar a tão propalada reforma, face ao clamoroso insucesso em que se traduziu a tentativa anterior. A Saúde Pública e o Serviço Nacional de Saúde não vivem de intenções nem de "juras de amor”; estamos fartos de palavras, plenas de demagogia mas vazias de significado.
Perante a surdez de Vossa Excelência esperamos que, com esta carta, aberta a todos os cidadãos, possamos ser ouvidos em sede própria e ver realizadas as nossas muito timoratas aspirações.
Respeitosamente,
Lisboa, 27 de janeiro de 2020
O Secretário-Geral
Jorge Roque da Cunha