Há cerca de um ano
o SIM alertava para a recorrente carência de médicos para formar equipas de urgência de obstetrícia que cumpram os critérios mínimos de segurança e qualidade no atendimento de grávidas e parturientes.
Um ano decorrido, alterações organizacionais do SNS tal como o é criação da sua Direção Executiva poucos efeitos tiveram...
A não ser tornar essas carências oficiais e transformar o temporário em permanente. As escalas para Junho, Julho e Agosto com encerramentos e desvios anunciados de Maternidades são disso prova.
Muitos dos serviços continuam a funcionar abaixo dos mínimos desejáveis e em situação de risco acrescido profissional e de erro médico, dada a ultrapassagem dos limites individuais diários, semanais e mensais do trabalho suplementar prestado. Os casos de burnout profissional acumulam-se e a possibilidade de manifestação súbita de doença é cada vez mais uma possibilidade e realidade.
Mas está tudo bem.
Até se anuncia, com total candura, o encerramento no período do Verão de dois blocos de partos do SNS (Hospital de Santa Maria - Lisboa e Caldas da Rainha) para grandes obras de remodelação. E já agora, para garantir um apoio extra em Lisboa os três grandes hospitais privados da capital (CUF, Lusíadas e Luz) foram convidados a dar uma ajuda temporária no Verão.
Coincidências...
Paralela e incompreensivelmente (ou não…) a Ordem dos Médicos vê o seu Colégio de Obstetrícia e Ginecologia descer a fasquia técnica e reduzir os efectivos numéricos das equipas médicas de urgência, ao mesmo tempo que se envolve num disse que não disse a propósito de uma Orientação da DGS que pretende redistribuir competências de profissionais no atendimento a parturientes. Declarações inflamadas e vestes rasgadas, mas...
Coincidências...
Como coincidências são a recusa do Sr. Primeiro-Ministro e do Sr. Ministro das Finanças em apoiar o Sr. Ministro da Saúde, dando aval para uma melhoria da grelha salarial dos médicos do SNS, escancarando a porta para um subir da contestação social em pleno Verão, chegados que estamos quase ao limite do prazo para um pretendido acordo negocial.
E como o dizia há dias um ex candidato a bastonário da OM "o problema do SNS não é um problema de organização”: "Não está a precisar nem de direcções executivas, nem de reorganizar as suas estruturas locais”. "Podemos fazer isso, claro que podemos, se forem melhores, mas o fundamental, os alicerces daquilo que sustenta o Serviço Nacional de Saúde, são os que estão em falta: os profissionais de saúde e o investimento. Sem isso, não há nenhuma organização do SNS que vá poder ter bons resultados”.
Talvez que as ilustres personagens acima referidas possam ler e apreender os caminhos apontados num
relatório sobre os recursos humanos da saúde, da autoria dos economistas Pedro Pita Barros e Eduardo Costa hoje apresentado, e que indicam que
"o ganho médio dos médicos do Serviço Nacional de Saúde (SNS) baixou 5% entre 2011 e 2022, enquanto o dos enfermeiros subiu 14%”.
Os investigadores concluem que "os médicos perderam 18% do seu poder de compra na última década, enquanto no caso dos enfermeiros a quebra do poder de compra é de 3%”.
Sobre as remunerações dos médicos, dão como exemplo a evolução prevista do salário mínimo nacional até 2026 – ano em que deverá chegar aos 900€ – para concluir que "seria necessário um aumento das remunerações dos médicos e enfermeiros entre 2023 e 2026 de 82% e 63%, respetivamente, para recuperar o diferencial entre salários de profissionais de saúde e o salário mínimo registado em 2011”.