Clara Ferreira Alves, Expresso, 24 fev 2018
O Serviço Nacional de Saúde está a desmoronar-se. A joia da coroa do Partido Socialista. Devido a doença de familiar próximo, passei parte dos dois últimos meses nos corredores e salas de espera do sistema. Literalmente, sentada nas cadeiras do SNS, quando há cadeiras disponíveis. A palavra-chave é disponibilidade. Quando se entra no túnel da prestação de cuidados pelo SNS verifica-se que nada está disponível. Não há camas disponíveis. Espera-se na urgência do hospital, entra-se no corredor da burocracia, e logo na primeira curva percebe-se que o hospital, os médicos, os enfermeiros, os auxiliares e administrativos, tudo, na verdade, está exaurido e exausto.
Nota-se que o SNS funciona porque os médicos, enfermeiros e auxiliares, com as suas carreiras mal pagas e confusamente definidas, ainda não desistiram do sistema. Embora se perceba a sangria para os privados. No meio das carências, encontrei, de auxiliares a jovens enfermeiros, de médicos a assistentes, uma competência generosa que o dinheiro não pagaria. Espero que não marchem para outros países ou não engrossem, como tantos, as legiões de profissionais do SNS do Reino Unido.
Uma urgência de hospital é um caos organizado com gente apressada a fazer o melhor que pode e sabe. A burocracia, tal qual existe, é um travão à funcionalidade do sistema. Não se entra no sistema sem gastar horas intermináveis nas cadeiras de plástico. Tempo de sobra para concluir que o sistema está a desmoronar-se.
Que a revisão imediata do SNS e a definição de carreiras públicas bem remuneradas na saúde não sejam uma prioridade política em Portugal enche-me de perplexidade. O sistema não aguenta um futuro preenchido pelos velhos da nossa tragédia demográfica. E, se queremos melhor saúde, se queremos continuar a ter os bons médicos e as boas máquinas, os bons tratamentos, teremos de pagar melhor saúde. Nós, os utentes.
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Expresso.